domingo, 30 de agosto de 2009

MENTIRAS VITAIS

Por Luisa Monteiro

As regras que aprendemos como membros de uma família nos indicam como tratar certos assuntos e o que devemos ignorar –os famosos “segredos de família”.
O dramaturgo norueguês Henrik Ibsen cunhou a expressão “mentiras vitais” para referir-a isso. Pois frequentemente transferimos à “família corporativa” o que aprendemos no âmbito familiar. É nas empresas que conseguem evitar as mentiras vitais, no entanto, que a inovação floresce e, segundo pesquisa, gera no cliente uma experiência positiva e diferenciada.
Autores: Warren Bennis, Daniel Goleman e Patricia Ward Biederman

Elas mascaram uma verdade ameaçadora, perigosa e dolorosa demais para ser dita em voz alta. Segundo os especialistas Warren Bennis e Daniel Goleman e a jornalista Patricia Ward Biederman, mentiras vitais ainda são a regra na maioria das organizações e também sua vulnerabilidade, já que transparência é um indicador de saúde moral.

Warren Bennis é um dos mais renomados especialistas mundiais em liderança, professor de administração da University of Southern California e fundador do Leadership Institute.
Daniel Goleman é codiretor do Consortium for Research on Emotional Intelligence in Organizations, da Rutgers University, e autor do best-seller Inteligência Emocional (ed. Objetiva), que mudou os paradigmas mundiais em relação à inteligência tanto no setor corporativo como fora dele.
Bennis e Goleman escreveram juntos Transparência – Como Criar uma Cultura de Valores (ed. Campus/Elsevier, em coautoria com James O’Toole).
Patricia Ward Biederman é colaboradora do jornal Los Angeles Times.

Embora algumas organizações “esclarecidas” optem por uma política de livros abertos, muitas mais são as que se caracterizam por pontos cegos e buracos negros, que impedem o livre fluxo de informações, a honestidade e a franqueza. Por que isso acontece?
Inicialmente, precisamos analisar as dinâmicas da vida familiar, pois este é o primeiro e mais forte modelo. As regras que aprendemos como membros de uma família nos mostram no que devemos prestar atenção e como devemos tratar aquilo que observamos.
Cada família ensina a seus integrantes tacitamente quatro regras de atenção:
• Essas são as coisas que observamos.
• Isso é o que dizemos sobre elas.
• Essas são as coisas que não vemos.
• Nunca dizemos nada a quem é de fora sobre a terceira categoria.
As duas últimas regras levam ao surgimento dos tais “segredos de família”. O dramaturgo norueguês Henrik Ibsen criou o termo “mentiras vitais” para caracterizar as ficções que encobrem uma verdade mais perturbadora em famílias problemáticas. Uma mentira vital mascara uma verdade que é ameaçadora demais, perigosa e dolorosa para ser dita em voz alta. A mentira vital preserva a harmonia superficial da família, mas a um preço muito alto. Problemas que não são reconhecidos raramente se resolvem sozinhos.
Dinâmica semelhante aflige muitas organizações. Por exemplo: em uma companhia de atuação mundial, o novo líder da área de recursos humanos expressou seu descontentamento com o fato de que seu antecessor utilizou um sistema de avaliação que classificava todo executivo como “excelente”, mesmo que a empresa estivesse perdendo centenas de milhões de dólares por ano. A mentira vital, que propagava que todos os líderes da companhia eram “classe A”, apenas encobria as falhas palpáveis desses executivos; não fazia os problemas desaparecer. No final das contas, as perdas contínuas forçaram a empresa a confrontar a obra de ficção que era sua “grande liderança”. Na reviravolta que se seguiu, praticamente todos os líderes antes tidos como “excelentes” foram substituídos.
O sentimento que leva as pessoas a se calar sobre as mentiras vitais é o medo inconsciente de que, se encaramos esses segredos perigosos e falamos sobre eles, vamos acabar destruindo a família ou sendo expulsos dela. A ansiedade de viver com esses segredos é frequentemente reduzida quando são ignorados.
Vale ressaltar que nem todos os segredos de família são ruins. Há “segredos doces”, que possuem um efeito de reforçar os elos, como os termos carinhosos que são únicos em cada família. O perigo reside em mentiras “tóxicas”, como o fato de uma mãe ser alcoólatra e não cuidar direito dos filhos, de que um tio já foi preso por abusar sexualmente de crianças ou de que a fortuna da família tem suas raízes em atos criminosos.
Quando mais tarde, como adultos, passamos a fazer parte de uma organização, levamos para dentro da “família corporativa” nosso aprendi- zado anterior sobre como ser parte de uma família. Sem que ninguém tenha de nos dizer explicitamente como são as coisas, automaticamente aprendemos o que observar e o que pensar e dizer sobre essas coisas. Também aprendemos o que ignorar, e nós já sabemos, a partir da experiência da infância, que não é para falarmos sobre as coisas que não devemos observar. Os medos do trabalho ecoam aqueles da vida familiar; se falamos do que não devemos falar, podemos ameaçar a própria organização e correr o risco de expulsão.
Todas as pessoas de uma organização têm experiência em guardar segredos, para o melhor e para o pior. Forças mais positivas, porém, também atuam aqui. O orgulho de pertencer a um grupo de alto desempenho ou de muito status e/ou o sentimento de acolhimento de fazer parte de uma unida família organizacional podem ser forças genuínas de satisfação profissional. O paradoxo está no fato de que há um lado ruim ao pertencer a um grupo: a tentação quase automática de esconder informações com o objetivo de proteger o orgulho compartilhado pelos membros, para fazer com que o grupo pareça melhor do que ele é ou simplesmente para preservá-lo. Tudo isso faz com que seja fácil para os integrantes do grupo suprimir informações ou distorcê-las.
No mundo do trabalho, conspirações de silêncio são enormemente danosas, e muitas delas são universais. Todos nós já trabalhamos em locais em que ninguém tratava dos problemas que todos conheciam: os casos de assédio no escritório, algo que ninguém enfrenta; os “jogos” em torno do orçamento, em que pessoas distorcem os números e exageram nas expectativas; o conselho diretivo que tacitamente reprime as discordâncias para apoiar um presidente carismático; o médico arrogante que comete erros que as enfermeiras veem, mas têm medo de apontar.
Leslie Perlow, da Harvard Business School, estudou uma empresa de equipamentos de escritório em que grande parte do tempo era gasta com reuniões semanais. Antes de sentar com o chefe toda semana, os engenheiros de sistemas da empresa gastavam tempo preparando apresentações capazes de impressionar, tempo esse que seria mais bem empregado em trabalho produtivo. Os engenheiros achavam que as reuniões eram grande perda de tempo, mas nenhum deles ousava dizer isso alto e bom som, por acreditar que os gestores queriam manter as reuniões. Ironicamente, o chefe dos engenheiros também achava que os encontros tinham pouco valor. Perlow constatou que o chefe não queria cancelar os encontros porque pensava que isso passaria a mensagem de que ele não valorizava o trabalho dos engenheiros. O que o pesquisador chama de “ciclo vicioso do silêncio” mina tanto a produtividade como o moral.
CÓDIGOS DE FAMÍLIA E EMPRESAS
As mentiras vitais das organizações mostram significativa similaridade com as das famílias. Vejamos um exemplo da vida familiar, em que a mãe é alcoólatra e os demais parentes adultos e os codependentes tacitamente facilitam seu comportamento. A mãe muitas vezes começa a beber antes do almoço e fica fora do ar lá pelo final da tarde. Em vez de falar sobre seu vício, os integrantes da família dizem que ela costuma “tomar um gole” ou, em vez de admitir que ela está praticamente desmaiada, comentam que ela “está tirando uma soneca”.
Assim como as famílias problemáticas, as empresas e outras organizações frequentemente encontram maneiras de falar de seus segredos e de suas culpas: usam código ou linguagem eufemística que quem é de fora não entende. O uso pela agência de inteligência dos Estados Unidos, a CIA, do termo “joias da família” para provas de tentativas de assassinato é exemplo disso.
Outro exemplo veio à tona no tribunal, durante os testemunhos sobre má conduta do departamento financeiro da HealthSouth. Os contadores e especialistas financeiros da empresa se referiam a eles próprios como “a família”, mesmo tendo eles armado acordos de negócio falsos para dar conta de expectativas de ganhos astronômicos. Nesse caso, os conspiradores corporativos se referiam à diferença entre os resultados trimestrais da empresa e as expectativas de Wall Street em relação a esses resultados de “o buraco”. E chamavam os acordos que eles inventavam para preencher esse buraco de “sujeira”.
Assim como ocorre com os segredos familiares, os segredos organizacionais distorcem os relacionamentos. Aqueles que partilham do segredo tendem a formar laços mais firmes e se distanciar dos de fora do grupo, a ponto de se separar daqueles que poderiam expô-los de alguma forma. Muitos dos escândalos corporativos foram denunciados por pessoas de dentro da empresa que viviam em camaradagem até o momento em que perceberam que a única maneira de se salvar da prisão era entregar os demais.
Transparência é um indicador da saúde moral de uma empresa. Acreditamos que governos, organizações e outras instituições têm uma espécie de DNA. Instituições “saudáveis”, a democracia inclusive, são mais transparentes do que as “doentes”, como a escravidão, que lutam para manter seus “segredos sujos”. No mundo dos negócios, a abertura não é somente uma política virtuosa que faz com que a empresa se sinta bem consigo mesma. O grau de abertura e o que isso diz sobre a natureza da organização se tornam vantagem competitiva tanto na geração de lealdade por parte do consumidor como na hora de recrutar e manter os melhores profissionais. Há evidências, por exemplo, de que os consumidores dão cada vez mais importância aos produtos orgânicos. Os valores também fazem diferença para aqueles que se destacam pela criatividade, como fica claro pelo grande número de pessoas que procuram emprego no Google, cujo mote é “Não faça o mal”.
Antes que uma organização possa desenvolver uma cultura de honestidade, ela deve analisar as regras culturais que a governam. Tais regras estão profundamente enraizadas e, geralmente, são resistentes à mudança [veja quadro ABAIXO].
A melhor forma de os líderes começarem a permitir que as informações fluam livremente em sua organização é dar bom exemplo. Eles devem aceitar, e até estimular, informações que gerem mudanças. Se os líderes demonstram regularmente que querem ouvir mais do que boas notícias e elogiam aqueles que com coragem apresentam verdades desagradáveis, então a norma começará a virar a favor da transparência.

Resistência à transparência: o caso Nasa
A agência espacial norte-americana, Nasa, é um exemplo irrefutável de cultura resistente a mudanças. A mesma prática cultural que contribuiu para a explosão da nave Challenger em 1987 continuava em vigor em 2003 e levou ao desastre da Columbia. O grupo que investigou os motivos da tragédia com a Columbia foi além da causa técnica do acidente –um pedaço de espuma que bateu em uma das asas e danificou seu sistema de proteção térmica– e responsabilizou a cultura organizacional, marcada por engenheiros com medo de levantar preocupações de segurança para seus superiores e gestores, mais preocupados em atender a cronogramas de lançamento do que com os riscos envolvidos em cada operação.
O líder da Nasa, Sean O’Keefe, chegou a garantir, logo depois da tragédia da Columbia, que nenhum funcionário que falasse sobre segurança, mesmo para pessoas de fora da organização, seria repreendido. Mas foram palavras ao vento aparentemente. Desde 2003, em vez de a Nasa evoluir na direção da cultura da franqueza, ela se tornou ainda menos transparente do que já era, por conta das pressões que sofreu. A política interna dessa agência continua sendo, e é cada vez mais, a de manter os funcionários longe da mídia –sobretudo quando se trata de expressar opiniões não apoiadas pela administração. Isso inclui certo cientista preocupado com um tema como aquecimento global... (WB, DG, PB)

HSM Management
© The Conference Board Review

domingo, 23 de agosto de 2009

QUAL É O SEU MODELO DE GESTÃO?

Por Luisa Monteiro


Diferentemente do modelo de negócio, que determina como uma empresa gera dinheiro, o modelo de gestão define o trabalho gerencial na organização.
Pode-se afirmar que “Qual é seu modelo de gestão?” é a segunda pergunta mais importante que um gestor deveria se fazer, depois de saber qual o negócio de sua empresa. Há quatro modelos principais de gestão, classificados segundo o grau de controle exercido sobre os meios e/ou sobre os fins: modelo de planejamento, da busca, científico e da descoberta.

Essa pode ser a segunda pergunta mais importante a que empresários e executivos devem responder sobre sua empresa. afinal, cada vez mais, o modelo gerencial tende a ser uma vantagem competitiva em si, como mostram Quatro anos de pesquisas de Julian Birkinshaw e Jules Goddard, especialistas da London Business school. Conheça Os quatro modelos principais.

Julian Birkinshaw é professor de estratégia e gestão internacional da London Business School, de Londres, Reino Unido, e autor do livro Giant Steps in Management, com Michael Mol (ed. Trans-Atlantic), que identifica as inovações mais importantes da gestão dos últimos 150 anos. Jules Goddard é membro do Centre for Management Development, da mesma instituição.

A Happy Computers é uma empresa de treinamento em informática sediada em Londres que movimenta US$ 6 milhões por ano e foi fundada por Henry Stewart. Com um fracasso na bagagem (um jornal chamado News on Sunday) e gosto pelas pessoas, Stewart decidiu desenvolver, em meados da década de 1990, uma grande empresa a partir de um conjunto diferenciado de princípios. Seus executivos são escolhidos com base em sua capacidade de gestão e são abertamente avaliados por seus próprios subordinados, e nunca se pedem as qualificações dos candidatos, pois eles são escolhidos em conformidade com sua resposta ao feedback sobre seu estilo de treinamento. Além disso, os erros são celebrados e o índice de satisfação do cliente, atualmente o maior de seu mercado (98,7%), é a medida mais importante de desempenho. A Happy vende seus cursos a £ 200 por dia, mais do que o dobro das £ 90 cobradas por seus concorrentes. Enquanto seu setor de atividade se contraiu em 30% ao longo dos últimos seis anos, a Happy dobrou seu faturamento.
A Topcoder é uma empresa norte-americana de US$ 20 milhões, fundada por Jack Hughes em 2000. Os projetos de software de clientes são separados em módulos, e cada módulo é aberto para a comunidade de 120 mil programadores da Topcoder. Eles são convidados a completar o projeto dentro de um período determinado. Uma competição típica pode ter de 10 a 20 participantes. Os desenvolvedores da melhor solução ganham um prêmio financeiro –dezenas de milhares de dólares. Hughes compreendeu que, para muitos programadores de primeira linha, a possibilidade de ganhar um prêmio é bem mais motivadora do que ser remunerado regularmente. Criando um modelo baseado em concursos para estruturar o trabalho e recompensar os esforços, ele foi capaz de alcançar o desejo intrínseco de reconhecimento das pessoas diante dos pares. A Topcoder está crescendo rapidamente e gerando alta visibilidade na comunidade do software livre.
A Happy e a Topcoder compartilham algumas características interessantes. Seu sucesso não pode ser explicado simplesmente por produtos ou serviços diferenciados –seus produtos são, em tese, iguais aos de centenas de outras empresas. E pensar sobre o modelo de negócio apenas nos leva até certo ponto. O modelo de negócio da Happy é idêntico ao de seus concorrentes; a Topcoder tem um modelo diferenciado, devido a sua base de custos flexível, mas seria grave injustiça explicar o sucesso da empresa somente nesses termos. O que explica seu sucesso, então?
Nós sugerimos que essas duas empresas estão se saindo bem porque seus fundadores optaram por pensar criativamente sobre seus modelos de gestão. Fizeram escolhas conscientes e incomuns sobre como definir objetivos, motivar as pessoas e coordenar o trabalho, e essas escolhas tiveram impacto positivo na qualidade, na reação das pessoas e no custo dos serviços que oferecem.

"Você pode gerenciar objetivos de modo direto: os gestores definem um conjunto claro de metas para sua equipe e um prazo para conquistá-las".

QUATRO ESCOLHAS
Veja o que descobrimos sobre isso em quatro anos de pesquisas, a partir da identificação de quatro conjuntos de escolhas à disposição do gestor:
• Qual é a natureza dos objetivos da empresa. Os gestores definiram um conjunto claro de metas de curto prazo? Ou eles perseguem um caminho oblíquo, enviesado, a partir da definição de objetivos de mais alto nível e de prazo maior?
• Como as pessoas são motivadas a perseguir esses objetivos. Os gestores tentam contratar e manter os bons funcionários com recompensas extrínsecas atraentes, como salário, benefícios e bônus? Ou eles focam recompensas intrínsecas, como a oportunidade de contribuir para a sociedade, o sentimento de realização ou o reconhecimento dos pares?
• Como as atividades são coordenadas. Os gestores focam o uso de processos formais e bem estruturados para entregar os resultados? Ou encorajam a coordenação informal e espontânea?
• Como as decisões são tomadas. Os gestores assumem pessoalmente a responsabilidade pelas decisões e confiam principalmente em seu próprio conhecimento e experiência? Ou eles preferem contar com o conhecimento de seus subordinados e designar uma responsabilidade coletiva?
Natureza dos objetivos
Um modo comum de gerenciar objetivos é a abordagem direta. Os gestores definem um conjunto claro de metas para sua equipe e um prazo para conquistá-las. Um princípio alternativo é gerenciar objetivos obliquamente: mirar o objetivo “A”, mas, no processo de conquistar “A”, chegar a um objetivo “B” que valha a pena. É o caso da empresa moveleira Ikea, cuja visão é “criar uma vida cotidiana melhor para muitas pessoas”. Esse é um objetivo oblíquo e, no processo de alcançá-lo, a empresa tornou-se muito lucrativa.
Esse princípio oblíquo foi formulado pelo economista John Kay em 1998. Seu argumento era que as empresas mais lucrativas são as que têm objetivos de alto nível, em vez de objetivos de lucratividade em si.
A definição direta de objetivos e a obliquidade têm, ambas, seu lugar na empresa moderna. Quando uma organização é relativamente simples e o ambiente no qual opera é bem compreendido e previsível, é possível definir um conjunto específico de objetivos e determinar um plano detalhado para alcançá-los.
Mas, em situações de mais incerteza e complexidade, o planejamento cuidadoso tende a escorrer pelo ralo, naturalmente, e o princípio oblíquo tende a ser mais efetivo. Considere como o presidente do conselho e CEO Eric Schmidt expressou os objetivos do Google em uma entrevista recente: “Quando tentamos priorizar projetos, perguntei-me como eu articularia os quatro ou cinco objetivos da empresa. Qual o objetivo número 1 da empresa? A felicidade do usuário final com a busca. Número 2: a felicidade do usuário final com os anúncios. Número 3: a construção da rede Google de parceiros para realizar os dois primeiros. E 4: conferir escala ao negócio. Então, concluí que nenhuma das coisas que eu deveria fazer como CEO –maximizar o lucro e o valor para o acionista– é objetivo para a empresa. Agora eu digo que, no final, você conseguirá um retorno excepcional por suas ações e será maximizada a felicidade do anunciante, se todos esses objetivos acontecerem. Muitos executivos se confundem com o objetivo. Pensam que o valor para o acionista é o objetivo. O valor para o acionista é consequência do objetivo”.
Evidentemente, a obliquidade também tem sua parcela de risco. De fato, uma de suas qualidades inerentes é que ela não se ajusta à simples prescrição. Uma visão muito ampla pode ser sintoma de arrogância e/ou de falta de pensamento correto. A Enron mudou sua visão de “a melhor empresa de petróleo e gás do mundo” para “a melhor empresa do mundo”, e todo mundo sabe o que aconteceu depois.
Motivar pessoas
Nos anos 1950, Douglas McGregor identificou dois princípios da motivação humana. A teoria X foi criada sobre a hipótese de que os funcionários são, por natureza, preguiçosos e precisam de recompensas extrínsecas, principalmente dinheiro, para desempenhar bem. A teoria Y foi criada sobre a hipótese de que os funcionários são ambiciosos, automotivados e valorizam recompensas intrínsecas, como o senso de conquista.
É amplamente aceito hoje que existem tanto motivações intrínsecas como extrínsecas e que os níveis dessas motivações variam com o indivíduo e com a natureza do trabalho. Mas também é amplamente aceito que a maioria dos indivíduos dedica-se mais a suas atividades voluntárias fora do trabalho do que àquelas pelas quais são pagos. Seria essa diferença em esforço devida ao fato de sermos remunerados? Ou à maneira como somos pagos? Ou, ainda, ao fato de a natureza do trabalho remunerado ser menos intrinsecamente interessante do que, digamos, o trabalho caritativo ou a elaboração de um perfil no Facebook? As respostas não estão claras, mas uma abordagem fértil à inovação do modelo de gestão envolve buscar novas maneiras de fortalecer a motivação intrínseca relacionada ao trabalho remunerado. É o caso da Topcoder, que alinhou sua estrutura de recompensa à necessidade intrínseca de reconhecimento pela comunidade. A empresa é capaz de gerar níveis bem mais altos de comprometimento do que geraria no modelo convencional de remuneração aos desenvolvedores de software.
O CEO da empresa indiana HCL Tecnologies, Vineet Nayar, apregoa que “os funcionários vêm em primeiro lugar e os clientes seguem depois”. E, com o objetivo de contratar e reter os melhores profissionais, ele está sempre à procura de maneiras de melhorar a gestão. Então, Nayar fez com que os resultados das avaliações do tipo feedback de 360º fossem publicados online e desenvolveu o conceito de “tickets de serviço”, relatórios nos quais cada funcionário expressa suas preocupações sobre o trabalho, as despesas ou até mesmo a cadeira em que se senta. Esse ticket só pode ser encerrado pelo próprio funcionário, e o número de tickets abertos é uma medida da qualidade da resposta da empresa em relação a seus funcionários.
A abordagem de Nayar trata funcionários como clientes, a fim de motivá-los a permanecer na empresa. “Os funcionários estão se acostumando a certo nível de serviço e têm dificuldade em buscar outras empresas nas quais não podem nem levantar essas questões. Então, estamos criando uma experiência única ao funcionário”, diz Nayar.
É claro que as recompensas extrínsecas ainda têm seu lugar nas empresas. Alguns prefeririam canalizar a maior parte de seu esforço adicional em trabalho voluntário. Certos trabalhos não são inerentemente atraentes e nenhuma dose de reformulação criativa convencerá o funcionário do contrário. Mas argumentamos que a maioria das empresas tem graus significativos de liberdade nessa dimensão, e elas podem drasticamente mudar o equilíbrio entre as recompensas intrínsecas e extrínsecas. Por exemplo, fazer o debug (depuração) do código de um software é uma tarefa altamente tediosa. A Microsoft criou, com essa finalidade, uma competição. Os vencedores recebem reconhecimento e prêmios em categorias como “o bug mais interessante descoberto” ou “o bug mais crítico descoberto”.
Coordenar atividades
A maior parte das grandes empresas é burocrática: aplica regulamentos formais e estruturas que assegurem a conformidade de comportamentos e gerem resultados coerentes. A burocracia é um princípio saudável, desde que os objetivos da empresa sejam eficiência, qualidade e redução de desperdícios. Se o objetivo é inovação e adaptabilidade, porém, ela atrapalha e o princípio alternativo da contingência (ou emergência) torna-se valioso. A contingência significa, essencialmente, a coordenação espontânea por meio de comportamentos autointeressados de atores independentes.
Sob determinadas circunstâncias, a imposição de regras e procedimentos deixará o sistema mais lento. As pessoas normalmente descobrirão a melhor maneira de agir se a decisão realmente for deixada para elas.
Isso não significa que o princípio da contingência seja sempre o melhor, mas sugere que existem muitas situações nas quais ele é melhor (quando a atividade gerencial não é apenas redundante, mas também potencialmente prejudicial ao comprometimento e às capacidades dos funcionários).
Há empresas que estão ativamente testando essas ideias. Considere, por exemplo, como a maioria das empresas de serviços de consultoria forma suas equipes de projetos. Os procedimentos usados para otimizar as necessidades dos clientes, o uso interno dos recursos humanos, o desenvolvimento de carreira e outros fatores são pesados, consomem tempo e raramente são eficazes. A empresa de consultoria Eden Mc- Callum, inglesa, adotou um lindo e simples modelo. Não emprega consultores em tempo integral. Em vez disso, temum pool de 300 freelancers cuidadosamente selecionados, que costumam dedicar de 10% a 50% de seu tempo aos projetos da Eden McCallum. Quando um cliente procura a empresa, ele escolhe quais consultores participarão de seu projeto. Isso torna os clientes mais felizes. Trata-se de um exemplo elegante sobre como coordenar sem um coordenador.
O risco da contingência é que pode resultar em eficiência de curto prazo à custa da eficácia de longo prazo. E isso pode trazer consequências deletérias à empresa. Pense, por exemplo, nos mercados de trabalho internos –a ideia de que as divisões são livres para contratar qualquer um e de que os funcionários são livres para se candidatar a qualquer divisão de que gostem. Isso é muito atraente à primeira vista, mas as empresas acabaram descobrindo que os funcionários tendiam a mudar de trabalho muito frequentemente, levando a enormes taxas de rotatividade e a rupturas.

"Você pode gerenciar objetivos obliquamente: mirar o objetiv o “A”, mas, no processo de conquistar “A”, chegar a um objetivo “B” que valha a pena".

Tomar decisões
O princípio da hierarquia confere aos gestores responsabilidade direta pelas decisões que tomam e dá-lhes autoridade legítima sobre sua equipe, porque valoriza a experiência e o conhecimento. O princípio alternativo é o da inteligência coletiva, que sugere que, sob determinadas condições, o conhecimento agregado de grande número de pessoas pode produzir previsões mais acuradas e melhores decisões do que poderia o conhecimento de pequeno número de especialistas.
O princípio da inteligência coletiva é aplicado nos mercados de ações, na prevenção de acidentes e na predição de resultados de eleições. Entretanto, suas implicações têm sido ignoradas.
Ao mesmo tempo que a hierarquia é necessária na maioria dos sistemas sociais como meio de canalizar a informação e subdividir tarefas, um subproduto indesejado da hierarquia é a suposição de que posição hierárquica é equivalente a expertise. Como resultado, os processos que surgiram em grandes organizações trazem embutida a crença de que os que estão no topo podem tomar decisões em nome da organização toda. Mas isso não está sempre correto e há muitos exemplos de empresas que usam a inteligência coletiva de seu pessoal.
Uma abordagem alternativa é o programa “Voice of Youth”, instituído pela Infosys, da Índia, no começo dos anos 1990. Sob a liderança de N.R. Narayana Murthy, presidente do conselho, a empresa decidiu que cinco ou seis de seus gestores de alto potencial e de menos de 30 anos deveriam apresentar seus pensamentos e insights na reunião anual de planejamento. Essa iniciativa ajudou os executivos da alta administração a ficar atualizados quanto ao pensamento do mundo veloz da tecnologia da informação. Então, levaram todo o processo de recrutamento para o ambiente virtual e realizaram eventos e programas para as jovens famílias dos funcionários.
A sabedoria coletiva também tem limitações. Um de seus riscos é fracassar em acessar uma comunidade adequada. O conceito de pensamento de grupo nos lembra que uma coleção de indivíduos com histórias semelhantes alcançará o consenso muito rapidamente, mas de maneira inapropriada. A recente crise de crédito é apenas um exemplo desse perigo. As agências de classificação de risco, bancos e investidores acreditaram que hipotecas requentadas, no mercado extremamente aquecido das moradias, poderiam ser de qualidade superior.
O segundo risco é permitir que o grupo realize demais –as pessoas podem oferecer conhecimentos ótimos, mas não devem ser substitutas para a avaliação gerencial. E, finalmente, o esforço coletivo tem capacidade limitada para tarefas criativas. A editora Penguin Group, da Inglaterra, tentou criar uma novela wiki em 2006, e os resultados foram desastrosos. Os colaboradores não mostraram nenhum interesse em dar continuidade ao texto dos outros e novos personagens apareciam a cada página. A inteligência coletiva funciona melhor com tarefas bem específicas, como a revisão dos valores da empresa (como fez a IBM), mas funciona mal se a tarefa carece de estruturação.
Como em outras dimensões dessa estrutura, é tentador ver o outro lado (nesse caso, a hierarquia) como o velho jeito de trabalhar que deve ser desafiado. Entretanto, essa seria uma interpretação equivocada. Os gestores sempre serão solicitados a fazer escolhas difíceis. Mas há maneiras importantes e efetivas de acessar a inteligência coletiva de seus funcionários.
COMO USAR ESSA ESTRUTURA
Convém entender as dimensões-chave da escolha e os princípios da gestão que ancoram cada dimensão, mas o valor real de nosso trabalho é colocar as dimensões juntas e identificar padrões ou arquétipos que podem
ser chamados de “modelos de gestão”. Tal abordagem propicia às empresas o poder que buscam para usar seu modelo de gestão como fonte de vantagem competitiva. Para fazer progressos nessa área, separamos as quatro dimensões em “fins” (por exemplo, motivar as pessoas) e “meios” (por exemplo, tomar decisões). E, para cada uma, fizemos a distinção entre princípios rígidos e flexíveis. Isso nos permite identificar quatro modelos de gestão fundamentais:
1. Modelo de planejamento: Muitas empresas grandes operam com objetivos de curto prazo, processos de gestão claramente definidos e tomada de decisão estritamente hierárquica. Essas são as empresas de melhor desempenho no mercado de ações, como a Exxon Mobil e o Wal-Mart.
2. Modelo da busca: Em relação ao modelo de planejamento, os meios da gestão são mais frouxos, mas há forte controle sobre os fins. É dizer aos funcionários o que fazer, mas não como fazê-lo. É típico de empresas de alto crescimento nas quais o fundador tem uma visão clara do que ele está tentando conquistar e encoraja as pessoas a perseguir esses objetivos por uma série de meios. Também é cada vez mais comum em empresas grandes que buscam retomar sua vitalidade. Nesses casos, a intenção costuma ser simplificar ou livrar-se daburocracia e da hierarquia, nos pontos em que elas atrapalham o crescimento.
A UBS Wealth Management, por exemplo, identificou que seu processo de orçamento era um entrave à evolução da empresa. Em 2003, seus gestores decidiram constituir um grupo de trabalho para viabilizar e conduzir o crescimento e eliminaram o orçamento como um item central de suas agendas. Surgiu um novo modelo: em vez de comparar o desempenho dos consultores do banco com um número do orçamento, a diretoria financeira os avaliaria em relação aos resultados do ano anterior e em relação a seus pares. Os consultores poderiam gastar quanto quisessem, mas seriam responsabilizados pelo retorno sobre tal investimento. Ao transferir o foco de um processo interno para o mercado real, a mudança de comportamento foi drástica. A empresa de gestão de patrimônio viu seu lucro crescer de 4,4 bilhões de francos suíços em 2003 para 6,6 bilhões em 2005, graças, em parte, a esse novo modelo.
3. Modelo científico: Mais um caminho alternativo ao modelo de planejamento é deixar os fins soltos e controlar os meios. É assim que a ciência evolui: há um cânone do conhecimento e existem regras claras
de compromisso, na forma de revisões, citações, divulgação de resultados etc. Mas os objetivos da ciência foram deliberadamente estruturados no sentido mais amplo possível: a busca do conhecimento.
Como isso se aplica aos negócios? Um exemplo interessante é o da Bill & Melinda Gates Foundation. Quando Gates decidiu criar a maior fundação filantrópica do mundo, em 2000, ele poderia ter mobilizado um exército de cientistas para avançar no combate às doenças que afetam as pessoas dos países em desenvolvimento de maneira desproporcional. Mas ele percebeu que nenhum planejamento o prepararia para fazer isso, então tomou uma estrada diferente. Em maio de 2003, pediu à comunidade internacional da saúde para lhe dar ideias que poderiam radicalmente mudar a saúde para melhor. Dessas ideias, ele e sua equipe científica identificaram 14 grandes desafios. Os pesquisadores, então, foram convidados a colocar propostas para sanar esses desafios; 43 das 405 propostas recebidas foram iniciadas em 2005. Ao envolver a comunidade científica em estruturar os objetivos da fundação, Gates gerou muito mais comprometimento e maior credibilidade pessoal do que se tivesse tentado agir sozinho.
4. Modelo da descoberta: Tanto os fins como os meios são mais soltos. Pode parecer a receita para o caos, mas pode ser eficaz para certas atividades e em alguns períodos. É o caso dos negócios iniciantes, operando em ambientes altamente ambíguos, nos quais há diversos caminhos potenciais e o sucesso é alcançado por tentativa e erro. Também é promissor para empresas estabelecidas que estejam buscando novas trajetórias para o futuro.
HÁ MAIS MODELOS
Esses quatro modelos de gestão ilustram as extremidades da estrutura. As empresas tendem a fazer suas escolhas entre as quatro dimensões e, inclusive, dentro de uma dimensão específica. Nosso propósito neste artigo não é prescrever um modelo à custa dos demais, mas trazer a terminologia “modelo de gestão” ao léxico e começar a fazer com que os gestores confrontem suas suposições escondidas sobre como o trabalho da gestão deve ser realizado.
O mundo da gestão continua a evoluir de modo interessante, e a emergência de novas tecnologias baseadas na internet está acelerando esse processo de evolução. Não é coincidência que algumas das práticas mais interessantes aqui discutidas estão sendo implantadas por empresas de internet, porque elas são adeptas de aproveitar o poder da tecnologia e apresentam menor probabilidade de ficar estagnadas pelos modos tradicionais de trabalhar. Ao apresentar esses princípios alternativos, esperamos tanto enriquecer como dar sentido ao fluxo de novas práticas de gestão.

HSM Management
© MIT Sloan Management Review
Reproduzido da MIT Sloan Management Review. © 2009, Massachusetts Institute of Technology.
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domingo, 16 de agosto de 2009

FERRAMENTA PREVINE ERROS NAS DECISÕES

Por Luisa Monteiro
Pesquisa com 83 decisões erradas de líderes políticos e empresariais identifica, com exemplos reais.
As quatro principais condições para que um erro aconteça: experiências enganosas, julgamentos errados, interesses pessoais inadequados e apegos inadequados. As formas de prevenir isso incluem desde dados e análises até debates sistematizados e desafios em grupo, passando por governabilidade e por monitoramento. Foco nas pessoas é essencial.
A principal razão das decisões ruins de líderes eficazes é afacilidade com que o cérebro humano se confunde e interpretamal um cenário. O que fazer? Citando casos reais, os especialistas Sydney Finkelstein, Jo Whitehead e Andrew Campbell apresentam,em artigo exclusivo, um sistema de diagnóstico PARA EVITAR ISSO

Sydney Finkelstein é professor de administração da Tuck School of Business, da Darthmouth University, de Hanover, New Hampshire, Estados Unidos, e autor do best-seller Por que Executivos Inteligentes Falham (ed. M. Books). Jo Whitehead e Andrew Campbell são diretores do Ashridge Strategic Management Centre, sediado na cidade homônima, a noroeste de Londres, no Reino Unido. Este artigo é inspirado no último livro dos três autores, intitulado Think Again: Why Good Leaders Make Bad Decisions and How to Keep it from Happening to You (ed. Harvard Business School Press).

Tomamos decisões todos os dias. Algumas são mais importantes do que outras. Inevitavelmente, em certas ocasiões cometemos erros. Afinal, somos apenas humanos. A amarga realidade,porém, é que mesmo as decisões de grande importância, tomadas por pessoas inteligentes e responsáveis, com ótimas informações e a melhor intenção, às vezes não são acertadas.
Bons líderes se equivocam. Grandes líderes inclusive. O presidente dos Estados Unidos John Fitzgerald Kennedy é famoso por seu grande erro na invasão da Baía dos Porcos; outro presidente, Herbert Hoover, não conseguiu fazer a economia norte-americana decolar depois do grande crash de 1929. A primeira-ministra britânica Margaret Thatcher chegou a propor um “poll tax”, imposto municipal, que fez com que fosse expulsa do próprio partido. Paul Wolfowitz, ex-subsecretário de Defesa dos Estados Unidos, foi convidado a renunciar ao cargo de presidente
do Banco Mundial por ter arranjado uma promoção e um aumento salarial para sua namorada, que também trabalhava no banco.
E erro não é privilégio de políticos e funcionários públicos, lógico. Também não faltam histórias de conhecidos líderes da área de negócios que cometeram erros graves. Juergen Schremp, presidente-executivo (CEO) da DaimlerBenz, levou a cabo a fusão entre esta e a Chrysler apesar da oposição interna –quase dez anos depois, a Daimler se viu praticamente obrigada a entregar a Chrysler a um fundo de capital de risco. Kun-Hee Lee, CEO da Samsung, conduziu a empresa a um investimento desastroso em automóveis. Ao ver que os prejuízos cresciam, teve de vender a divisão automobilística por um décimo dos bilhões que gastara nela. An Wang, fundador da companhia de produtos eletrônicos Wang, insistiu em criar um sistema operacional proprietário para os microcomputadores de sua empresa, mesmo depois de já estar claro que o microcomputador da IBM se tornaria o padrão do segmento; Wang desapareceu do mercado. Richard Fuld se negou a aceitar as consequências do agravamento da crise de crédito e a pensar em vender o banco Lehman Brothers até ser tarde demais; quando se dispôs a agir, não encontrou comprador. E o CEO do Yahoo! Jerry Yang insistiu que a empresa valia muito mais do que o mercado e a Microsoft acreditavam. Sua negativa obstinada em avaliar a oferta de compra da Microsoft custou a seus acionistas US$ 30 bilhões e, no final da história, Yang ficou desempregado.
Erros acontecem, portanto. Mas por que os bons líderes tomam decisões ruins? E como podemos diminuir o risco de isso acontecer conosco?
CONDIÇÕES DO ERRO
Para encontrar a resposta, analisamos o processo de tomada de decisões em organizações de todo tipo e porte no mundo inteiro [veja abaixo SAIBA MAIS SOBRE A PESQUISA E AS 83 DECISÕES ERADAS QUE FOCOU]. Começamos por investigar as condições sob as quais um erro é cometido. Em toda má decisão há, normalmente, dois fatores em jogo:
• Um indivíduo ou um grupo de indivíduos que cometeu um equívoco.
• Um processo de decisão que não consegue corrigir o erro.
Quando alguém se engana, o normal é que o processo de decisão resolva o erro: são aportados dados que contradizem a ideia errada ou pessoas com opiniões diferentes influenciam o resultado. Às vezes, no entanto, o processo falha. Seja pelo motivo que for, quando a questão é analisada, os pontos de vista errôneos não são expostos nem corrigidos. Consequentemente, centramos nossa investigação na maneira como nosso cérebro toma decisões e nas razões pelas quais ele se confunde e fica enredado em ideias falsas.
Identificamos quatro condições sob as quais é mais provável que um pensamento defeituoso seja produzido, a que denominamos “condições de bandeira vermelha”, porque encerram uma advertência sobre a possibilidade de interpretar mal a situação. Decisões complexas, que implicam uma interpretação e um juízo, são difíceis de tomar. Exigem debate –mas como se percebe quando a própria pessoa ou a outra parte argumenta com base em uma posição tendenciosa? Exigem consenso –mas como saber se é verdadeiro? Nossas condições de bandeira
vermelha são uma ferramenta de diagnóstico para detectar quando se corre o risco maior de se equivocar e quando a pessoa encarregada de decidir deve dar um passo atrás e “voltar a pensar”.

Existem quatro condições de bandeira vermelha: experiências enganosas, julgamentos errados, interesses pessoais e apegos inadequados


Experiências enganosas. São recordações que parecem semelhantes à situação que estamos enfrentando, mas na realidade não são. O mais provável é que perturbem nosso processo de pensamento quando avaliamos a situação, seja porque não conseguimos reconhecer o padrão, seja porque a emoção ligada ao padrão nos orienta a um rumo de ação inadequado. As experiências enganosas contribuem para mais da metade das decisões erradas. Por exemplo: os enormes lucros conquistados com empréstimos subprime e o sucesso das obrigações de dívida garantidas desorientaram os banqueiros de todo o mundo e os levaram a correr riscos que agora parecem absurdos.
Desde 2001, quando se tornou CEO do Bank of America, Ken Lewis avançou com a estratégia de aquisições mediante acordos com a Countrywide e a Merrill Lynch. O problema é que em ambos os acordos, e especialmente o com a Merrill Lynch, a aquisição é muito diferente do tipo de compra praticado anteriormente, como a compra do Fleet Bank, e o ambiente econômico é outro. A experiência de Lewis em fusões e aquisições se revelou enganosa quando chegou a vez da Merrill Lynch, e a empresa teve de pagar o preço por isso.

Uma simples conversa sobre o problema com um amigo ou colega pode ser uma forma de desafiar os preconceitos

Julgamentos errados. São decisões ou julgamentos prévios que afetam as decisões atuais de maneira adversa. É muito provável que criem distorções quando avaliamos os resultados, levando-nos a nos comprometer com planos equivocados. Além disso, podem fazer com que nos limitemos a um plano de ação em particular, geralmente algo que funcionou bem no passado. Em
1999, o primeiro-ministro britânico Tony Blair pronunciou uma conferência em Chicago na qual defendeu uma política intervencionista nos “Estados falidos”. Esse preconceito afetou sua decisão sobre o Iraque.
Fred Goodwin, ex-CEO do Royal Bank of Scotland (RBS), foi o arquétipo da nacionalização do sistema bancário no Reino Unido. Há pouco tempo, o RBS anunciou o maior prejuízo da história bancária britânica. Em dois anos, a empresa perdeu cerca de 90% de seu valor de mercado. Goodwin sustentava que o crescimento viria exclusivamente de aquisições. Em outras palavras, prejulgou que esse enfoque era o adequado. Além disso, o fato de ter pago à vista em dinheiro, e ainda em 2008, produziu grande escassez de moeda corrente no banco e ocasionou a derrocada do que já tinha sido uma grande companhia.
Interesses pessoais inadequados. São os que entram em conflito com as responsabilidades
que temos para com stakeholders. Habitualmente, se sabemos que um indivíduo tem um interesse pessoal em jogo, pedimos a ele que saia da reunião ou que se abstenha de votar. Na verdade, parte da crise financeira atual pode ser atribuída à falta de alienação de interesses entre banqueiros com receitas pessoais muito elevadas e um sistema financeiro estável. Por que John Thain não pensou duas vezes antes de gastar US$ 1 milhão para decorar seu novo escritório na Merrill Lynch? Por que garantiu que seu pessoal recebesse bônus quando a empresa estava perdendo bilhões de dólares? Por que insistiu em um bônus de US$ 40 milhões para si mesmo? Fica claro que não se sentou para pensar na melhor maneira de espoliar os acionistas. Em certa medida, por um interesse pessoal profundamente arraigado, que funcionava em um nível subconsciente, nunca passou por sua cabeça que alguma dessas medidas fosse pouco razoável.
Apegos inadequados. São sentimentos fortes em relação a um grupo, um lugar ou uma posse que não são apropriados em função da decisão que precisamos tomar. Em momentos como o atual, quando muitas organizações têm de demitir funcionários e vender ativos, certas lealdades anulam as decisões racionais em relação à redução de pessoal e levam a conservar ativos inconvenientes porque “o presidente gosta de trabalhar neste negócio”.
Os apegos emocionais também explicam por que o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, demorou tanto a se livrar do ex-senador Tom Daschle depois que se tornaram públicos os erros que este cometeu. Obama é muito apegado à ideia de atenção médica universal e via Daschle como o arquiteto indicado para essa revolução. Não fosse o artigo do jornal The New York Times, que deu argumentos de sobra para sua destituição, é possível que Daschle ainda estivesse em seu posto.
Todas essas bandeiras vermelhas podem desequilibrar os processos mentais de quem deve tomar decisões. Mas é possível evitar alguns erros com medidas de proteção.
MELHOR PREVENIR
Não existe um vínculo direto entre uma condição de bandeira vermelha em particular e determinada medida de proteção. Escolher um método de prevenção não implica apenas identificar a condição, como também conhecer as pessoas e a empresa. É claro que não é possível eliminar todos os riscos; os líderes sempre cometerão erros, mas as probabilidades podem diminuir. Vejam como:
Experiência, dados e análises. Uma medida de proteção implica aportar experiências ou novos dados e análises aos encarregados de tomar decisões. Durante a crise cubana dos mísseis, por exemplo, o então presidente John F. Kennedy precisava conhecer a quantidade, a localização e o estado de preparação dos mísseis para determinar se era factível levar a cabo um ataque militar. Também tinha de saber de quanto tempo dispunha antes que os soviéticos representassem uma ameaça real e significativa para a segurança dos Estados Unidos. Com o objetivo de obter essa informação, solicitou à Força Aérea norte-americana que realizasse voos de reconhecimento.


O problema da análise de negócios convencional é que ela ignora a parte mais importante do panorama: os responsáveis pela tomada de decisões



Debate e desafio em grupo. Uma simples conversa sobre o problema com um amigo ou colega pode ser uma forma de desafiar os preconceitos. Nas grandes organizações, uma maneira clássica de organizar o debate é formar uma equipe de decisão. A eleição das pessoas que farão parte desse grupo é vital para definir a qualidade do desafio que vai acontecer. Por exemplo, uma companhia de produtos alimentícios do Reino Unido, que conta com várias divisões de negócios, costuma escolher um gerente de outra divisão para presidir o grupo de decisão. A intenção é aportar uma perspectiva desafiadora, e possivelmente mais objetiva, à decisão. Governabilidade. Algumas vezes, é difícil gerar um debate aberto ou isso se torna insuficiente para desafiar um ponto de vista poderoso e profundamente arraigado. Nesse caso, a equipe de governabilidade, que aprova a proposta remetida pela equipe de decisão, pode cumprir essa função essencial. O presidente Kennedy atribuiu a si mesmo tal papel na crise cubana dos mísseis. No caso de uma aquisição importante, a equipe de decisão pode ser formada pelo CEO e pelo diretor financeiro, e o time de governabilidade ser conduzido pelo presidente do conselho de administração.
Monitoramento. Como medida preventiva, o acompanhamento é normal em quase todas as decisões. Entretanto, naquelas em que há condições de bandeira vermelha que se mostrem difíceis de abordar com as três primeiras proteções, a última defesa está em implementar um acompanhamento extra. Na crise cubana dos mísseis, Kennedy não podia ter certeza de que a decisão tomada era a correta. Sabia que contava com dados limitados sobre a forma como os russos responderiam a sua decisão de bloquear Cuba. Portanto, abriu novos canais de comunicação com Kruchev para monitorar o efeito do bloqueio em seu modo de pensar. Essa estratégia trouxe mais informações a Kennedy sobre as reações do líder russo e o ajudou a conceber a ideia de trocar os mísseis da Turquia pelos de Cuba.
FOCO NAS PESSOAS
O mais importante é voltar a colocar o foco nas pessoas-chave das organizações: os líderes. O núcleo de nossa análise é a premissa de que os líderes são capazes de tomar boas decisões. Mas, para fazê-lo, têm de ampliar sua compreensão sobre o que acontece quando se veem diante da habitual combinação de dados desestruturados e incompletos, perspectivas diferentes, pressões de prazo e outras fontes de incerteza. Todos compartilhamos alguns atributos devido à forma como nossos cérebros evoluíram, e esses atributos explicam, em grande medida, a maneira como pensamos e agimos. Se os líderes não tomam consciência das bandeiras vermelhas que lhes aparecem, correm o risco de se enganar desnecessariamente.

SAIBA MAIS SOBRE A PESQUISA E AS 83 DECISÕES ERADAS QUE FOCOU
O livro Think Again: Why Good Leaders Make Bad Decisionsand How to Keep it from Happening to You (ed.Harvard Business School Press), de Sydney Finkelstein, Jo Whitehead e Andrew Campbell, que inspirou este atigo, baseou-se em uma pesquisa sobre decisões equivocadas de líderes políticos e empresariais.
Os autores explicam a amostra: “Não escolhemos asque simplesmente resultaram em fracasso; procuramos também as que tinham falhas no momento em que foram tomadas –decisões que, se fossem mediadas por uma análise inteligente, teriam se mostrado erradas.
“Obviamente, muitos resultados medíocres se devem à má sorte ou ao fato de que riscos foram corridos. Não é simples distinguir uma decisão mal tomada de um risco que não teve o resultado esperado. Portanto, avaliamos cada situação particular: com a informação disponível no momento, uma pessoa razoavelmente competente teria tomado a mesma decisão?
“Também procuramos opiniões discrepantes no processo de tomada de decisões, que mostrassem ter havido debate. Ou seja, na falta de dissidências, excluíamos a decisão de nossa análise”, esclarecem os autores.

FONTE:
HSMManagement 75
Julho-agosto 2009
hsmmanagement.com.br

domingo, 9 de agosto de 2009

É PRECISO OUVIR AS MÁS NOTÍCIAS

Por Luisa Monteiro


Ser empreendedor é uma ocupação exigente e arriscada, que também pode ser muito ingrata: segundo números oficiais, a maioria das novas empresas fracassa no primeiro ano.
Este artigo, que aproveita a experiência pessoal de um empreendedor envolvido na criação de diversas empresas, afirma que osucesso de um empreendimento depende de uma boa ideia e a exposição dessa ideia às críticas.
A obtenção do feedback negativo é a primeira regra de ouro dos empreendedores; outras duas regras são compartilhadas, nesta reportagem, por Tom Blondi, experiente empreendedor norte-americano.

A reportagem é de Kery Susan Smith, colaboradora da knowledge@wharton.
O fato de ter participado da abertura de capital de diversas empresas ensinou a Tom Blondi que existem dois ingredientes essenciais para que um projeto seja bem-sucedido. Em primeiro lugar, alguém precisa propor uma boa ideia. Em segundo, o criador deve ouvir feedbacks negativos a respeito de sua ideia. Na verdade, o feedback negativo talvez seja o elemento mais importante da receita de sucesso. “Poucos entre nós podem chegar a uma ideia perfeita sem um feedback”, disse Tom Blondi. “Se você tem uma grande ideia, apresenta-a para alguém e é aceita prontamente, sem reservas, então não é uma boa ideia.”
Empreendedores precisam de quem lhes faça perguntas diretas e específicas de como o negócio funcionará. Amigos e parentes, em geral, não são as pessoas mais ndicadas para atuar como grupo de opinião para o idealizador da empresa.
Ouvir algo além de “Brilhante!”, “Você vai ganhar uma fortuna!” pode ser duro para o provável empreendedor. Afinal, quem está disposto a arriscar seu tempo e esforço em fundar um negócio costuma estar muito ligado a suas ideias e visão do negócio. Mas ele precisa aprender a ouvir feedbacks se quiser ter investidores. Senão, não será um empreendedorrealmente. “Uma pessoa só se torna um empreendedor para valer quando tem alguém mais investindo na ideia dela”, segundo Blondi.
Ele disse que costumava sentir um aperto no coração quando ouvia suas ideias serem questionadas. “Achava que a pessoa estava, de certa forma, com inveja de mim. Mais tarde percebi que era apenas uma crítica construtiva.”
Na trilha do empreendedor
“A melhor pessoa para orientar um empreendedor no início de um processo é aquela que tem um histórico de sucessos e fracassos. Conhecer o que funciona é importante, mas experiências pessoais a respeito do que não funciona são igualmente importantes.”
Tom Blondi vivenciou as duas situações desde que começou a fundar empresas, há 18 anos. Seu primeiro projeto foi um sucesso: chamava-se “Gestão Internacional de Idiomas” e se localizava no estado do Colorado. Essa empresa adquiriu softwares criados nos Estados Unidos e desenvolveu-os para serem rodados em computadores no Japão, na Europa e na América Latina. Fez sucesso desde o início, tanto que Blondi e demais investidores venderam o negócio para a Berlitz. “Depois disso eu sentia que sabia tudo. Isto é: até o projeto seguinte.”

Blondi disse que costumava sentir um aperto no coração quando ouvia suas ideias serem questionadas. “Achava que a pessoa estava, de certa forma, com inveja de mim. Mais tarde percebi que era apenas uma crítica construtiva”

Depois, Tom Blondi se tornou diretor de marketing da Cyclone Commerce, companhia de software sediada no Arizona, que possibilitava às organizações o envio de documentos pela web com segurança. Até então elas eram obrigadas a passar por fax ou utilizar serviços noturnos para enviar faturas e outros documentos para seus parceiros. Era uma grande ideia, mas nunca cresceu tanto quanto a equipe de gestão havia previsto, segundo o próprio Blondi. “Jamais conseguimos diferenciar nosso produto das opções existentes aos olhos dos investidores.” A empresa lutou, não funcionou, mas os investidores encontraram uma estratégia de saída satisfatória: ela foi comprada pela Axway, atual subsidiária do Sopra Group, sediado na França.
Desde então, Tom Blondi vem se envolvendo com diversas empresas, quase sempre para conduzi-las ou para treinar líderes sucessores. No momento, ele é presidente da Ethix Media, que tem um produto chamado Homeminders, software instalado na web que permite ao proprietário de uma casa gerenciar desde as rotinas básicas de toda manutenção, como a troca de filtros dos sistemas de aquecimento e refrigeração, até o levantamento do patrimônio. O usuário é o proprietário da casa, mas o cliente normalmente é uma grande empresa que patrocina o software e o oferece de presente como ferramenta de sua marca.
Blondi disse que gosta de oportunidades em que possa construir alguma coisa. “Estou procurando um compromisso de longo prazo, não um projeto para durar um mês”, afirmou. No entanto, ele não está em busca de uma colocação permanente. Aliás, ele já está apresentando sua próxima investida, um aplicativo de criação escandinavo projetado para ajudar as pequenas e médias empresas a diagnosticar suas vulnerabilidades de segurança online. Nessa empresa ele atua como investidor e também como presidente.
O tipo certo
No início Tom Blondi não dirigiu sua vida para se tornar um empreendedor. Formou-se em matemática e física pela Southern Illinois University. Seu primeiro emprego foi como programador de computador da Sears. “Naquela época, nós realmente escrevíamos códigos em vez de entrar neles”, ironizou ele. “Eu não era muito bom nisso, e não estou brincando. Meu chefe na época disse que eu me comunicava melhor do que codificava.”
“Você só ouve falar das histórias de sucesso. Só contam as coisas boas. Há muito esforço e sofrimento para se tornar um empreendedor”

Assim Blondi obteve uma colocação na qual poderia falar e sair da programação de computadores. Ele trabalhava como elo entre os programadores e os usuários não técnicos. Ele os ouvia e então passava suas necessidades para os técnicos. Essa posição lançou sua carreira no setor de softwares. “Hoje em dia, em comparação com os anos 1970, os jovens demonstram mais interesse em lançamentos e outros projetos menores”, disse Blondi. Porém as grandes organizações, que não são mais consideradas seguras, ainda têm certas vantagens.
“Essas companhias estão aí há uns cem anos e realmente estão encolhendo, mas ali você pode aprender em dois anos o que levaria dez em qualquer outro lugar.”
O empreendedorismo se tornou mais atraente nos últimos 20, 30 anos. No entanto, “você só ouve falar das histórias de sucesso. Só contam as coisas boas. Há muito esforço e sofrimento para se tornar um empreendedor”.
“Esse trabalho envolve muita dedicação e grande quantidade de estresse. Muitos projetos simplesmente não sobrevivem. Em 2006, a Small Business Administration estimou a abertura de 671,8 mil empresas, das quais 544,8 mil já haviam fechado pelos registros de 2008. Nem todas fracassaram. Algumas foram vendidas para outros setores. Mas o sucesso duradouro é enganoso. Além disso, não existe nada comparável a precisar chamar um amigo ou familiar que investiu em um projeto em que você perdeu o dinheiro dele por causa de decisões que tomou.”
Antes de escolher esse caminho, é prudente fazer-se algumas perguntas, alertou Blondi: “Sou talhado para ser empreendedor? É algo que eu realmente queira fazer?”.
É importante lembrar que o fundador de uma empresa não é o único ator nesse início de jogo. Na verdade, os geradores de ideias normalmente estão em minoria na hora da largada. As outras pessoas precisam ser daquele tipo que se sobressai na execução, afirmou Blondi.
Muitas vezes os fundadores de empresas encaram de maneira egocêntrica o lançamento de um projeto, mas essa não é a melhor abordagem. “Descobri que a construção do consenso, embora algumas vezes pareça retardar o processo, acaba facilitando as coisas. Você precisa desse apoio para fazer acontecer.”

Três regras de ouro para o empreendedor
1. Para um empreendedor, é decisiva a obtenção de feedback para refinar suas ideias sobre um projeto de negócio. Poucos são capazes de ter ideias que conseguem fazer sucesso sem ter sido buriladas.
2. A carreira de empreendedor não é para todos. Por ano, uma porcentagem alta de projetos lançados fracassa. É um trabalho intenso e exigente. Qualquer um que esteja pensando em começar uma empresa precisa decidir se isso se ajusta a sua personalidade.
3. Empreendedores contam com os outros para que seu sonho de uma empresa de sucesso possa se tornar realidade. O tempo extra para construir consenso frequentemente é recompensado.
O peso do emocional no empreendedor: uma perspectiva brasileira

por Fábio Seixas*

Já passei pela criação de sete empresas start-ups, algumas como empresário, outras como colaborador. Aprendi muito com isso. Start-ups são o playground de pessoas inovadoras. Nesse ambiente é possível inovar sem ser “muito” recriminado, ao contrário do que acontece em empresas estabelecidas, cujo ambiente normalmente não favorece a inovação. Em toda minha carreira, que chega aos 15 anos, só trabalhei em uma empresa com mais de 150 funcionários –e olha que eu já passei por várias empresas.
E não me arrependo. Montar start-ups é uma atividade muito interessante, pois, a cada nova empreitada, você percebe que ainda tem muito a aprender e que sempre haverá uma situação com a qual você ainda não lidou. Esse aprendizado conquistado com o próprio suor não tem preço. E não estou falando de técnicas de gerenciamento, negociação ou vendas; me refiro a emoções com que aprendemos a lidar quando deparamos com situações críticas, no relacionamento com pessoas ou clientes, ou quando trombamos com adversidades do mercado. Nenhuma faculdade ou MBA pensa em trabalhar o desenvolvimento emocional de gerentes ou empreendedores. Focam apenas o aprendizado técnico, que, a meu ver, não responde por nem 30% das características necessárias para obter sucesso empresarial.
Cada nova start-up é um passo no vazio, na incerteza. Pessoas que conseguem tirar convicção de situações como essas são verdadeiros empreendedores. Geralmente, esse tipo de vivência não se aprende trabalhando em grandes empresas, onde as incertezas são, por definição, menores –ou onde se faz tudo para que sejam.

* Fábio Seixas é um jovem empresário do Rio de Janeiro, analista de sistemas, sócio-fundador do Camiseteria.com e palestrante.


Fonte:
HSM Management
© Knowledge@Wharton
Reproduzido de Knowledge@Wharton, publicação da Wharton Business School,da University of Pennsylvania, com a correspondente autorização.
(http://knowledge.wharton.upenn.edu/)

domingo, 2 de agosto de 2009

ALERTA VERMELHO PERMANENTE

Por Luisa Monteiro




Entrevista com Philip Kotler.
De agora em diante, as empresas têm de criar um sistema de gestão para passar pelos períodos turbulentos da economia que freqüentemente vão se intercalar aos de calmaria, em uma nova normalidade que se pode chamar de “caos”. Em essência, ele deve aumentar a capacidade de adaptação corporativa ao comportamento dos clientes em todos os níveis.

O “sistema de gestão do caos”, capaz de responder mais adequadamente a uma realidade marcada pelos sobressaltos da economia e dos mercados, é desenvolvido por Philip Kotler nesta entrevista exclusiva a revista HSM Management.

Imagine que todos os médicos fossem atuar nas extremidades de seu mercado. Eles se tornariam, ao mesmo tempo, profissionais de pronto-socorro e de postos de saúde que objetivam
a prevenção. É mais ou menos isso que as empresas terão de fazer na nova era do caos. Trata-se da aposta do “pai” do marketing Philip Kotler, segundo o qual a partir de agora as empresas terão de instalar um sistema de alerta (prevenção) e resposta rápida (o atendimento de pronto-socorro) que lhes permita desenvolver rapidamente novos cenários quando a economia entrar em queda, o que deve acontecer com frequência, e atuar neles.
Em outras palavras, as empresas precisarão abandonar a sensação de segurança que haviam construído com políticas, estratégias e táticas resultantes de anos de tentativa e erro e aceitar que agora surgiu um ponto de inflexão estratégica gigantesco. Ou mantêm a estratégia e correm os riscos derivados dessa decisão –o novo ambiente pode castigar e, inclusive, levar à ruptura–, ou reconhecem a necessidade de uma nova.
O novo livro de Kotler, Chaotics (escrito em parceria com John A. Caslione e publicado pela Amacom) busca formatar essa nova estratégia, ou, como eles preferem chamá-la, esse sistema de gestão do caos. Em entrevista exclusiva a José Salibi Neto, Kotler repassa os fundamentos desse sistema e quais as especificidades para economias emergentes em geral e para o Brasil em particular. Vale notar que Kotler não entra no mérito sobre se isso é pior ou melhor –é diferente e, por enquanto, inevitável. E exige outra abordagem de enfrentamento pelas empresas.
Minha primeira pergunta não poderia deixar de ser: é verdade que nunca mais voltaremos aos tempos normais?
Sabe o que eu ando dizendo aos presidentes de empresas? Que eles precisam ter um telefone perto de suas camas à noite no caso de uma grande ameaça ou grande oportunidade surgir, exigindo sua atenção imediata. Companhias mundiais hoje operam 24 horas, sete dias por semana, e o CEO simplesmente precisa estar disponível. Conheço casos da Unilever e da Bear Sterns nos quais o fato de os CEOs não estarem acessíveis quando necessário prejudicou os negócios.
Então, a resposta para você é: nunca mais voltaremos à idade de ouro da normalidade. John Caslione e eu achamos que os líderes empresariais precisam compreender isso de uma vez por todas. Fenômenos como globalização e digitalização introduziram uma nova dimensão de velocidade e interdependência em nossas vidas. Não há retorno possível.
Isso já vem sendo falado há algum tempo no mundo empresarial, mas, pelo que eu depreendo do que o sr. diz, fala-se principalmente da boca para fora...
Sim, isso foi articulado há alguns anos por Andy Grove, CEO da Intel, em seu livro Só os Paranoicos Sobrevivem. Ele dizia que uma empresa deve observar a frente, os lados e os fundos, porque os golpes vêm de todos os lados, e esse é, de fato, o princípio básico para as empresas se armarem melhor. O que nós fizemos foi aprofundá-lo e detalhá-lo na prática e com os pontos de vista do marketing e da estratégia.
Em vez de confiar numa business intelligence casual, as empresas devem construir um amplo sistema de alerta, que lhes permita observar a frente, os lados e os fundos. Em vez de falar superficialmente sobre planejamento para contingências, devem fazer planejamento de cenários. Em vez de estabelecer um orçamento fixo para cada departamento, devem definir orçamento variável. Os departamentos precisam saber com antecedência o que cortar se o mercado submergir e o que aumentar se as oportunidades de repente explodirem.
Nosso sistema de gestão do caos [chaotics management system] apresenta um retrato da empresa do século 21 muito atento ao conjunto pronto de respostas a diferentes surpresas, choques e oportunidades que podem surgir.
O sr. pode nos dizer se há aspectos específicos para empresas de países emergentes?
Acredito piamente que o sistema de gestão do caos se aplica a todas as empresas de todos os países. Mas, se alguns países são mais sujeitos a choques do que outros, e isso pode descrever alguns países emergentes, é maior ainda a necessidade de nosso sistema de gestão do caos.
Em um momento em que as economias emergentes ganham os holofotes e que a projeção dos BRI Cs [Brasil, Rússia, Índia e China] parece cada vez maior, esse sistema de gestão funciona apenas para o marketing e a estratégia de empresas ou também para o marketing e a estratégia de países?
Publiquei um livro há alguns anos sobre o marketing das nações. Os princípios básicos de construir uma economia e uma sociedade fortes permanecem os mesmos ali descritos, mas muitos ajustes são necessários devido ao aumento da turbulência que todos os países agora estão vivenciando e também ao aumento de interdependência –todo país tem de exportar para que possa ganhar o suficiente para importar bens que são mais baratos em outros lugares. Além disso, as cadeias de fornecimento estão ficando mais longas; qualquer interrupção do fornecimento de um país tem ramificações em outros países, o que gera uma “fragilidade interconectável”.
Não é possível ao Brasil voltar à autonomia que tinha nos anos 1960. O Brasil tem de saber produzir valor continuamente e saber comprar e vender em uma base de valor em qualquer lugar do mundo e, para isso, ele e todos os outros países precisam estar mais alertas aos fatos mundiais e à constante mudança que vem acontecendo. Com as devidas adaptações, nosso sistema de gestão do caos pode ajudá-los nisso, sim.
O sr. vê a inovação constante como essencial no sistema de gestão do caos? Ou é mais uma questão de disciplina? Que lado –inovação ou disciplina– as empresas em alerta vermelho permanente devem priorizar?
Sempre achei que os gestores deveriam considerar três períodos de tempo ao abordar o impacto de qualquer decisão de vulto: agora; daqui a dois a três anos; de cinco a dez anos. E continuo acreditando que isso é válido nesta era do caos. Quando a administração só considera a disciplina de eficiência, é pensando principalmente em hoje e tentando arrancar o maior lucro do período corrente. Nunca pensei que esse foco no agora fosse suficiente.
Por exemplo, disciplina, no pensamento de [Peter] Drucker, quer dizer fazer certo as coisas (eficiência) mais do que fazer as coisas certas (eficácia). Só que líderes precisam ser eficazes, sobretudo de agora em diante. Então, a inovação é a prioridade. Tão absolutamente prioritária que sou a favor de construir o pensamento inovador em toda a organização.
Então, mudo minha pergunta: desses três horizontes de tempo, qual é o prioritário no sistema de gestão do caos?
Nenhuma empresa deve começar seu pensamento com o que fazer em relação à recessão atual. O ponto de partida é onde ela quer estar daqui a cinco ou dez anos. Que clientes ou problemas sociais quer resolver? Ao trabalhar de trás para frente, a empresa compreenderá qual o melhor mix de disciplina e inovação para seu caso.
No caos, o sr. recomenda investir em oportunidades, manter as pessoas-chave e não deixar de preservar as áreas que os consumidores mais valorizam. Esse é o tipo de pensamento que deve prevalecer numa empresa?
Sim, de agora em diante as empresas precisam pensar proativamente sempre, não só durante uma queda. Uma sabedoria velha mas sempre atual é: um lado de uma crise é a vulnerabilidade;
o outro é a oportunidade. As empresas precisam fazer regularmente uma análise SWOT para checar suas oportunidades, ameaças, fraquezas e forças. Isso não significa que as mesmas táticas de ação são garantidas tanto em tempos bons como ruins, mas pede uma mentalidade sempre proativa.
Que oportunidades o sr. está identificando do outro lado dessa crise especificamente?
Em geral, a oportunidade gira em torno de avançar sobre os concorrentes, adquirindo seus ativos ou seus talentos. Claro, isso é mais factível para empresas fortes financeira e competitivamente.
“a oportunidade gira em torno de avançar sobre os
concorrentes, adquirindo seus ativos ou talentos”

O avanço pode ser também roubar mercado dos concorrentes –nessa seara, historicamente, companhias orientadas a preço como McDonald’s e Wal-Mart são as que se dão bem durante recessões. Estamos vendo um grande crescimento das dollar stores nos Estados Unidos, lojas onde as pessoas podem economizar; marcas mais baratas também vêm se destacando.
Mas não creio que esse seja o único tipo de oportunidade de ganhar mercado. As empresas precisam descobrir respostas criativas para os consumidores que estão hesitando em comprar porque acham que os preços vão cair ainda mais ou porque têm medo de perder o emprego. A Hyundai recentemente se ofereceu para receber de volta seu carro novo se o proprietário perdesse o emprego. Outra empresa se ofereceu para devolver a diferença se o preço caísse mais tarde, a fim de aumentar a vontade de comprar agora.
É possível resumir a essência do enfrentamento desta nova era do caos?
Eu diria que acelerar mudanças, elevar os níveis de complexidade nos negócios e mensurar os riscos e a incerteza são a matéria-prima do marketing e de sua nova realidade. Para se defender,
as companhias devem aumentar sua capacidade de adaptação em todas as instâncias, especialmente nas áreas de marketing e vendas.
Outro ponto fundamental é que são exigidos, no marketing em particular, grandes profissionais que consigam esperar o inesperado e que, em tempos caóticos, possam reinventar os modelos de negócio e as estratégias de marketing, para reagir rápido aos fatos.
O sr. destacou as empresas orientadas a preço baixo em épocas recessivas. Como a recessão será sempre ou iminente ou instalada, preço virará a eterna prioridade do consumidor?
Recessões têm o efeito de construir “maior consciência” nos consumidores. Estes passam a se perguntar: “Por que precisamos de certos itens que comprávamos à vontade antes da recessão? A comida em um restaurante caro é tão especial assim? A bolsa de grife é muito melhor que as outras?”. Alguns começam a pensar “menos é mais” em vez de morrer de trabalhar e ter pouco tempo de lazer. Se isso se tornar uma visão difundida, mudará profundamente as premissas e estratégias do marketing convencional. Embora, quando a economia começa a melhorar, a restrição diminua, não devemos esquecer que, talvez paradoxalmente, o pensamento ambientalista tende a permanecer em alta nestes tempos de caos. Não que o consumidor vá se envolver com a grande questão de como controlar a mudança climática, mas, em seu comportamento doméstico, buscará maneiras “menos é mais” de ajudar o meio ambiente, apagando as luzes etc.
A neurociência vem fazendo grandes revelações sobre o consumidor. Ela vai ajudar as empresas a enfrentar o caos?
Graças à neurociência, estamos enfim desistindo do velho modelo propagado pelos economistas de que os consumidores calculam racionalmente os custos e benefícios de cada compra e escolhem a oferta que maximize a relação custo-benefício. Sabemos que as emoções e o inconsciente desempenham grande papel na escolha da marca. O trabalho de Gerald Zaltman e experiências de economistas comportamentais estão revelando muita coisa sobre a escolha do consumidor. Algumas descobertas são especialmente surpreendentes para mim, como quando Martin Lindstrom, autor de Buy-ology, conta que os pôsteres que trazem os dizeres “Cigarro mata” na verdade abrem o apetite dos fumantes para acender um cigarro.
O problema da neurociência é que em geral ainda é muito difícil interpretar, explicar ou confiar nela.
O sr. pode nos dar exemplos de empresas que vêm lidando bem com a crise?
Para mim, são as que não só reduzem custos, mas também agregam valor à vida de seus consumidores. O Wal-Mart contratou 33 mil novos colaboradores para incrementar o serviço nas lojas e melhorar a experiência dos consumidores ali, facilitando a movimentação naquelas lojas enormes.
A e.l.f. Cosmetics se esforçou para oferecer cosméticos de qualidade a preços baixos e torná-los disponíveis para todos, e está usando as redes sociais para construir uma comunidade de beleza na qual as consumidoras possam trocar informações sobre suas necessidades e experiências.
A Half Price Books é uma varejista de livros de desconto que tem vendido por menos da metade do preço dos editores. Eles estão aumentando as lojas e vêm experimentando o crescimento nas mesmas lojas há vários meses, vendendo livros de autoajuda, inspiracionais, de treinamento e sobre novas carreiras.
A Southwest Airlines, em vez de aumentar as tarifas de bagagem e refeições, se manteve como uma companhia aérea que não cobra taxas e obteve êxito em manter suas vendas e construir confiança com o público que viaja. Enquanto isso, outras companhias aéreas estão acrescentando taxas por excesso de peso nas bagagens, refeições etc. para manter altos seus lucros. Mas a Southwest Airlines está usando isso como oportunidade para divulgar o slogan “Sem taxas”.
Uma rede hoteleira mexicana demonstrou criatividade ao dizer que qualquer pessoa que pudesse ter contraído gripe suína em seus dez hotéis teria três diárias grátis nos próximos três anos se houvesse evidência de que tinham se contaminado em um hotel da rede. Em todos os países podem ser encontradas empresas que estão transformando a crise em oportunidade.
Qual seria o papel da mídia digital no sistema de gestão do caos de companhias de todos os tipos? Ela torna mais fácil gerenciar essa situação?
A mídia digital tem dois papéis nessa história. Ela exacerbou a disponibilidade e a velocidade de transmissão de notícias tanto para o bem como para o mal. Para o bem, considere, de um lado, a rapidez com que a gripe suína se alastrou e, de outro, a rapidez com que as informações sobre ela circularam e com que os países tomaram precauções para proteger sua população.
O aspecto nocivo é que as pessoas precisam lidar com a informação com cuidado. É mais fácil do que nunca circular desinformação e rumores que podem ferir ou iludir pessoas e empresas. Vivemos em uma era de muita informação e as empresas devem alocar recursos para detectar e gerenciar os fluxos dela. E, para isso, devem usar a própria mídia em sua função “para o bem”, nesse estado que eu denomino de “alerta vermelho permanente”.
As mídias tradicionais –jornais na linha de frente– vêm tendo sua morte anunciada todos os dias. O que o sr. pensa a esse respeito?
Mídias raramente morrem. Elas geralmente encolhem em nichos nos quais podem manter bom desempenho. A televisão não matou o rádio ou o cinema. Os computadores não mataram a televisão. Com relação à crise dos jornais, sei que é difícil manter um jornal funcionando com seu tamanho atual quando a receita de anúncios está se transferindo para a internet –e as pessoas jovens não recorrem aos jornais para obter notícias. Os bons velhos tempos dos jornais se foram de fato. Mas os jornais podem manter público tendo apelo mais especializado e indo para a internet.
Não acho que os anunciantes consigam atingir seus objetivos se migrarem totalmente para a nova mídia digital. A maioria das empresas vai ganhar se usar um mix de novas e velhas mídias, cada uma fazendo o que faz melhor e sendo medida.
Qual é o papel das redes sociais para as empresas neste novo mundo caótico?
Redes sociais como Facebook, MySpace, Twitter e outras desafiam nossas práticas de marketing tradicionais. Primeiro, porque as pessoas passam mais tempo conversando com amigos e família em seus computadores e telefones e, consequentemente, menos tempo vendo TV, cujos comerciais costumavam ser a maior fonte de influência publicitária. Hoje a porcentagem de mensagens sobre marcas vindas de fontes comerciais em contraposição a fontes sociais está diminuindo rapidamente.
Então, cabe aos profissionais de marketing fazer duas coisas. Uma é monitorar as conversas para descobrir se sua marca é tema de discussão e, se for, quão favorável ou desfavorável é a conversa. Está cada vez mais difícil para uma empresa hoje oferecer má qualidade e pouco valor sem que o boca a boca espalhe palavras venenosas sobre sua marca. As companhias estão cada vez mais em um aquário e não têm escolha além de produzir boa qualidade em troca de dinheiro.
Segundo, as empresas precisam descobrir melhores maneiras de identificar potenciais clientes com a mídia social. Seria maravilhoso se uma empresa como a Wilson pudesse comprar uma lista de todos os membros do Facebook que tivessem o tênis como hobby. Infelizmente o Facebook não vai vender esse tipo de informação, porque isso afastaria seus membros. O mínimo que a empresa pode fazer é inserir e circular informações sobre si mesma em mídias sociais como blogs, podcasts e outras.
O Twitter, que está mostrando rápido crescimento, é particularmente promissor por poder carregar mensagens curtas sobre uma marca para um número enorme de pessoas em seus computadores ou celulares.
É fácil construir marcas fortes em momentos como este? Como o sr. avalia as chances para marcas de países emergentes em especial?
Uma crise econômica é um momento em que os consumidores estão buscando custos mais baixos sem sacrificar a qualidade. Os países emergentes têm a vantagem dos custos mais baixos. A questão é se os produtores locais de marcas fortes em países emergentes podem lançá-las com sucesso em países economicamente avançados.
Minha resposta para isso é: sim, ainda mais com a ajuda das mídias sociais de que acabamos de falar. Estou vendo um fabricante mexicano de produtos de panificação vendendo bem sua marca no Texas e em outros estados do sul dos Estados Unidos. Até porque os Estados Unidos têm vários grupos de imigrantes, que servem de primeiro alvo a ser mirado por uma marca emergente, ao qual se seguirão outros alvos.
Como ficarão as marcas durante os momentos de crise da era do caos?
Uma crise econômica produz um momento de “destruição criadora”. Os fracos afundam. E isso faz sentido porque uma das maiores causas de recessão é o excesso de capacidade. Temos capacidade demais para produzir automóveis, eletrodomésticos, eletrônicos e outros itens e isso derruba os preços. É necessária a racionalização do setor. O que está sendo destruído é o excesso de capacidade e os destruidores são os que se saem melhor em seu setor. Então, na era do caos, a destruição criadora será bem mais frequente e as empresas devem estar preparadas elas mesmas para promovê-la e, ao mesmo tempo, devem investir em novas marcas. Há a imensa oportunidade do marketing social, por exemplo. Acabei de publicar, com Nancy Lee, um novo livro, Up and Out of Poverty: The Social Marketing Solution, no qual oferecemos uma nova abordagem para ajudar pessoas pobres a sair da armadilha da pobreza por meio de empresas praticando marketing social.
O sr. pode explicar isso melhor?
Paradoxalmente, o problema do “excesso de capacidade” é, em outra parte do mundo, um problema de “consumo de menos”. Há 4 bilhões de pessoas pobres no mundo que adorariam ter uma bicicleta, uma moto ou um carro, ou um computador ou uma TV. O problema é que elas não têm dinheiro. Seriam o melhor mercado que alguém poderia desejar se simplesmente tivessem dinheiro para comprar bens. Descrevemos mais de uma dúzia de casos nos quais o marketing social tem sido usado para aumentar a adoção de telas mosquiteiras para proteger crianças contra mosquitos e malária enquanto dormem, nos quais o marketing de camisinhas reduziu o tamanho de famílias e preveniu a difusão do HIV e muitos outros exemplos. Recentemente, 700 profissionais de marketing social se encontraram na Primeira Conferência Mundial de Marketing
Social, em Brighton, Inglaterra, para trocar experiências e compartilhar ferramentas e tecnologias para combater as principais causas da pobreza.
E como deve ser o marketing para investidores, já que o dinheiro é uma questão-chave em tempos instáveis?
Muito bem lembrado. Caso a empresa não tenha habilidade de marketing para levantar dinheiro nestes tempos em que ficarão mais frequentes a escassez de fundos e o alto risco, é particularmente importante que a desenvolva. Ela deve usar um marketing cada vez mais criativo para convencer os investidores a apostar em suas propostas de negócios, já que hoje há abundância de oportunidades para investir o dinheiro e muitos concorrentes dispostos a pagar um retorno realmente alto. Toda empresa deve pensar em montar uma linha de marketing para trabalhar essa habilidade.
“No caos, a destruição criadora será bem mais frequente e
as empresas devem se preparar para promovê-la”

Com o aumento da tecnologia, o que o sr. acha que vai acontecer com mercados como o de alimentos, muito importante no Brasil, por exemplo?
Virá mais crescimento econômico dos avanços tecnológicos, como robótica, nanotecnologia e biotecnologia, do que de setores estáveis. Mas os mercados de alimentos e de outros itens básicos vão permanecer fortes e relativamente estáveis. Sempre haverá nichos de crescimento nesses setores, assim como nichos em declínio.

Saiba mais sobre Philip Kotler
Professor de marketing internacional da Kellogg Graduate School of Management, da Northwestern University, Philip Kotler é considerado o grande precursor do marketing mundial, assim como seu livro Administração de Marketing, escrito em 1967 e constantemente revisto e ampliado, segue sendo a bíblia dessa disciplina, obrigatório em praticamente todos os cursos de administração do mundo. Natural de Chicago, Illinois, Estados Unidos, ele estudou na University DePaul, fez mestrado na University of Chicago e doutorado no Massachusetts Institute of Technology, sempre em economia.
Depois, cumpriu um pós-doutorado em matemática na Harvard University e outro em ciências do comportamento na University of Chicago. Eleito o primeiro “líder em pensamento de marketing” pelos membros da prestigiosa American Marketing Association, Kotler recebeu diversos prêmios em marketing e presta consultoria a grandes empresas, como AT&T, IBM, Shell e Merck. Ele é autor ou coautor de mais de 15 livros, muitos dos quais já foram lançados no Brasil e traduzidos para mais de 14 idiomas. Ele provavelmente é o único especialista mundial que consegue abordar todas as áreas do marketing, de marketing em instituições não lucrativas a marketing de lugares, passando por marketing para investidores.
Kotler virá ao Brasil a convite da HSM para o Fórum Mundial de Marketing e Vendas, em 18 e 19 de agosto deste ano.

Questões operacionais de marketing e vendas
O grande desafio do marketing será rever os gastos, área por área:
Pesquisa de marketing. Um pouco de pesquisa continua sendo necessário para entender os clientes, para não seguir apenas a intuição e a experiência dos vendedores. Entretanto, podem-se cancelar custosos estudos que demoram meses e cujas conclusões são menos relevantes em tempos caóticos.
Produtos. Convém descontinuar os produtos com pouca possibilidade de gerar lucros. A crise também dá a oportunidade de produzir modelos mais simples e vendê-los a um preço menor.
Serviços. Muitas empresas oferecem um pacote de serviços incorporados à compra de seus produtos. Uma área em que se podem reduzir custos é a dos serviços que custam mais para a empresa do que valem para os usuários.
Publicidade. Se a empresa investe muito em comerciais de 30 segundos, deve reduzir ou até eliminar essa publicidade. É preciso concentrar o gasto em seus mercados fortes e onde seja possível defender e expandir a participação. Além disso, vale transferir alguns fundos para novos meios digitais.
Preços. Melhor que reduzir preços pode ser oferecer benefícios adicionais. Se isso não funcionar, podem-se apresentar versões básicas mais econômicas. Vender os mesmos produtos a um preço menor é outra opção, mas sob o risco de arranhar a imagem da marca.
Margens. Quando se procura equilíbrio entre o volume de vendas e as margens de lucro em mercados turbulentos, convém ajustar os preços e a proposta de valor às necessidades mutáveis do cliente, manter um olhar constante nas mudanças repentinas que acontecem nas estruturas de preços e atualizar permanentemente a informação sobre sensibilidade ao preço.
Distribuição. Muitas empresas operam com intermediários (atacadistas, varejistas, agentes e outros), que transportam e vendem seus produtos. Na presença de um mercado deprimido, não é conveniente suprimir intermediários. O ideal é motivá-los, com promoções e incentivos.
Vendas
Manter o orçamento de marketing é a melhor maneira de proteger as vendas. Depois, é preciso evitar o pânico, e algumas medidas ajudam:
• Identificar os pontos fortes e fracos do grupo.
• Dispensar os vendedores cujo baixo desempenho seja suficientemente comprovado.
• Não se esquecer de que a queda da economia cria oportunidades, pois tudo está mudando.
• Trocar a tradicional pressão sobre a equipe por estas iniciativas: capacitar, criar ou amplificar o espírito de equipe, não ceder à tentação de rebaixar preços para fechar acordos, encontrar novas maneiras de motivar os vendedores, manter as expectativas elevadas porém não inalcançáveis, não mexer na base salarial da equipe em tempos difíceis. (Fonte: Chaotics).

Fonte: HSMManagement 75 • Julho-agosto 2009

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