Veja os principais:
• Urgência das empresas de inovar para compensar a consequente redução nas vendas que vem dos consumidores cada vez mais insatisfeitos e da concorrência crescentemente feroz –e também de eventuais recessões macroeconômicas.
• Pressão sobre os orçamentos para inovar de maneira mais barata.
• Necessidade de escapar das elevadas taxas de insucesso das inovações, como a verificada entre os produtos de consumo –apenas 18% dos novos produtos sobrevivem em três anos e a maioria não vende muito bem mesmo assim.
• Possibilidade de aproveitamento da capacidade intelectual existente fora das próprias fronteiras.
• Total coerência com a era das redes sociais e da web 2.0.
• O fato de que ser produzida por profissionais de qualquer lugar de fora da organização em qualquer parte do mundo torna a inovação aberta potencialmente mais poderosa, porque é mais surpreendente e menos imitável.
Não faz muito tempo que a inovação aberta se estabeleceu como processo possível no mundo dos negócios: cinco anos, no máximo. E não são muitas as organizações que já a abraçaram: entre as de primeira linha, umas 150 apenas. A pioneira foi a Procter & Gamble, que a iniciou em 2002, mas Johnson & Johnson, General Mills, Bill and Melinda Gates Foundation também estão nesse seleto grupo. Todas adotam o programa –e o conceito– “conectar e desenvolver” (connect and develop, originalmente) ou C&D, que foi encabeçado por Larry Huston, ex-vicepresidente de inovação da P&G e e atualmente consultor nessa área em sua empresa, a 4Inno, além de professor da Wharton School.
Como diz Huston a seguir, em entrevista concedida com exclusividade à Adriana Salles Gomes: “Estamos falando de algo maior que um modelo de negócio; estamos falando de um novo paradigma de inovação, que, mais cedo ou mais tarde, todas as empresas terão de incorporar. É a passagem da velha P&D, sigla de pesquisa e desenvolvimento, para o C&D, de conectar e desenvolver”.
O (velho) modelo de invenção
“A maioria das empresas ainda está amarrada ao que chamo de ‘modelo de invenção’ ou ‘modelo do tudo inventado aqui’, apoiado numa infraestrutura de tijolo e cimento e na ideia de que a inovação reside dentro dessas quatro paredes.
As empresas até tentam turbinar seus departamentos de P&D com aquisições, alianças e terceirização seletiva em alguns casos, mas todas essas são mudanças incrementais, curativos band-aid numa ferida mais profunda.”
caso P&G
A explosão de novas tecnologias aumentava a pressão sobre nossos orçamentos. Nossa produtividade de inovação, medida em vendas por pessoa de P&D, caía muito e a porcentagem de novos produtos que atingia suas metas financeiras estancou em 35%. Nossa ação chegou a cair de US$ 118 para US$ 52 e perdemos metade de nosso valor de mercado. Foi quando nos impusemos o desafio de gerar US$ 5 bilhões por ano em novas linhas de produtos.
Aí fomos lançar a Pringles Prints, nova linha de crisps com figuras e palavras divertidas. E conseguimos fazer isso em tempo recorde e por uma fração do custo usual. Descobrimos uma pequena panificadora em Bolonha, na Itália, herdada e comandada por um professor universitário de engenharia elétrica, que desenhou o próprio forno de assar e inventou um método com jato de tinta para imprimir imagens comestíveis em bolos e biscoitos. Selamos uma parceria com ele e adaptamos sua inovação rapidamente a nossas batatinhas.
Conectamos e desenvolvemos. Isso fez a North America Pringles ter crescimento de dois dígitos. Sabe como encontramos esse professor em Bolonha? Fizemos um briefing do desafio e o enviamos para 9 mil pessoas de fora da Procter & Gamble. A proposta acabou chegando ao e-mail dele.
Metade das inovações lançadas pela Procter & Gamble desde então vem de fora das fronteiras corporativas, sendo que, destas, 35% se originam em empresas individuais ou de pequeno porte. Nos últimos seis anos dobraram o fluxo de caixa e o lucro, houve incremento de 60% na produtividade de P&D e o índice de inovações bem-sucedidas saltou de 35% para 75%.
A empresa tem 9 mil funcionários dedicados a pesquisa e desenvolvimento, mas, somando os parceiros em 71 países, são 1,8 milhão de pessoas buscando inovar pela Procter & Gamble. Tanto que a companhia tem mais de 27 mil patentes registradas. Isso mudou até sua vocação. Agora ela é uma empresa de ciência e não de marketing. E fatura US$ 86 bilhões por ano.”
O novo modelo C&D: seis passos
“A implementação do modelo C&D não se limita a ser receptivo às ideias de fora. Nós o montamos na Procter & Gamble com um indivíduo fazendo ligações com gente de fora e o expandimos até ter 70 pessoas dedicadas a isso, que foram capazes de identificar milhares de produtos, ideias de produtos e tecnologias promissoras. Resumidamente, elas têm de identificar uma necessidade –com os consumidores ou não–, criar um briefing sobre isso, achar um modo de distribuí-lo interna e externamente (primeiro é preciso verificar se a resposta a tal necessidade pode ser desenvolvida, a contento, internamente). Tal briefing pode ser distribuído para 5 mil pessoas lá fora, por exemplo. Aí vêm as respostas, sempre tecnológicas –afinal, inovar é juntar o que é necessário para o consumidor com o que é possível pela tecnologia. E essas 70 pessoas devem poder estimar a possibilidade de sucesso em cada caso.”
O processo C&D, trabalhado tanto na P&G como pela consultoria de Huston, tem seis pontos:
1. Por que mudar. Saber com clareza quais são os “mandatos” da própria companhia, ou seja, seus limites e suas facilidades.
2. O que fazer. Definir a visão ou o foco dos negócios.
3. Onde atuar. Escolher a região geográfica.
4. Como vencer. Aprender qual é a maneira de operar ali visando ao êxito.
5. Quem buscar. Mapear quais as capacidades necessárias para vencer: ferramentas, habilidades e tecnologias.
6. Como viabilizar tudo isso. Desenvolver a gestão e a governança (da rede de parceiros) apropriados.
É nos itens 5 e 6, sobretudo, que entra a rede de parceiros. No que diz respeito ao item 6 especificamente, o objetivo deve ser o de se tornar o parceiro preferencial do pool de talentos, cuidando deles e alimentando-os, mantendo-os, por exemplo, 20% ocupados com projetos seus o tempo todo. Não adianta fechar um projeto cada três anos com eles; você vai perdê-los.
“Veja bem: estamos falando de algo maior que um modelo de negócio; estamos falando de um novo paradigma de inovação, que, mais cedo ou mais tarde, todas as empresas terão de incorporar. É a passagem da velha P&D, sigla de pesquisa e desenvolvimento, para o C&D, de conectar e desenvolver.”
Inovadores: das páginas amarelas à gestão
“Uma das tarefas que minha firma de consultoria executa é a elaboração de um tipo de ‘páginas amarelas’ de parceiros potenciais. Depois as empresas estabelecem seus acordos com eles. Esses acordos seguem uma espécie de Lei de Moore. O primeiro leva 12 meses para ser concluído, o segundo 6 meses, o terceiro 3 meses e, ao longo de um período de cinco anos, constrói-se uma relação bem engrenada.”
Abertura e crise
“Esse modelo de inovação aberta nasceu como resposta a uma crise –no caso, a crise que a Procter & Gamble estava atravessando desde 2000, com a saída de seu CEO, com a demanda por novos produtos para casa, com a influência da biotecnologia e da genômica em seu mercado etc. Então, ele é muito adequado à crise financeira que observamos atualmente.
Hoje já temos entre nossos clientes uma montadora automobilística europeia especializada em carros de luxo, porque a crise atual atingiu em cheio especialmente essa indústria. Ela tem uma infraestrutura gigantesca de inovação interna e resolveu recorrer a esse modelo para mudar as coisas.”
Aquisições X crescimento orgânico
“A maioria das empresas maduras precisa ter um crescimento orgânico de 4% a 5% por ano no mínimo, além de eventuais aquisições, que respondem por 2% a 3%, somando 6% a 8%. O problema é que as aquisições, embora devam crescer nesta crise, são arriscadas e caras, por isso é interessante garantir o crescimento orgânico.”
Apoio da alta cúpula
“Temos provas suficientes de que o apoio a esse novo modelo de negócio precisa vir de cima, senão não funciona. Como cria valor para o acionista, esse apoio se justifica totalmente. O apoio do CEO da Procter & Gamble [Alan G. Lafley] ao projeto foi crucial para seu êxito.”
Mudança cultural
“Sem uma mudança de cultura que consiga combinar ativos intelectuais internos e externos em condições equitativas e seja capaz de substituir a mentalidade ‘não foi inventado aqui’ por ‘orgulhosamente encontrado fora daqui’, a inovação aberta não se estabelece. Isso passa tanto por adaptar os sistemas de remuneração de acordo com esses objetivos como por ações de comunicação intensivas e comportamentos exemplares da alta cúpula. A cultura começa a ter motivação pela busca de soluções fora dos limites corporativos –partindo do princípio de que estas já existem, só precisam ser localizadas. É o que chamo de foco nos produtos ‘prontos para usar’. É um tom perscrutador e não se deve ter medo de procurá-las e explorá-las. É preciso, acima de tudo, acrescentar o know-who ao know-how.”
Especialidades de inovação por país
“Os diferentes países podem ter especialidades de inovação que as empresas do modelo C&D vão buscar ali. Por exemplo, a China atrai por sua inovação de custo, que muita gente confunde erroneamente com redução de custo. Eles focam custo como objetivo: o cliente lhes dá o preço a que quer chegar e eles fazem a engenharia reversa para chegar a ele. Por exemplo, um aparelho de barbear elétrico que custava US$ 18 passou a US$ 3 e depois a US$ 0,90. Eu testei e funciona bem! Não conheço suficientemente a América Latina nesse sentido nem a região tem despertado muito o interesse de meus clientes como fornecedora de inovação ainda. Mas cabe aos países latino-americanos investir nisso. A Finlândia, por exemplo, decidiu investir ativamente em apoio à inovação, por entender que o bem-estar de seu povo –e de qualquer nação– agora está intimamente ligado à capacidade que o país tiver de inovar.”
Como as pessoas de fora podem implementar
“Sua empresa não precisa faturar o equivalente a bilhões de dólares para você adotar o modelo C&D. Empresas de todos os tamanhos podem alavancar ideias e ativos de outras companhias e, na verdade, as empresas menores provavelmente têm mais facilidade de fazê-lo. Vale a pena começar a pesquisar redes externas como NineSigma, YourEncore e InnoCentive.”
Tamanho do desafio
“Hoje a maioria das empresas não tem ninguém do lado de fora. Enfrentei o desafio de reverter isso duas vezes: na P&G por sete anos e em minha firma de consultoria. Hoje, na 4Inno, temos 20 funcionários e 400 parceiros externos na rede de inovação. Não é fácil, mas é possível.”
1. São uma estrutura de irradiação, ou seja, com o centro (a empresa principal) e os raios.
2. Têm métricas muito bem definidas.
3. Baseiam-se no compartilhamento de riscos e recompensas por todas as partes –o que significa que a empresa central não pode querer ganhar muito mais que as outras.
4. Todas seguem um desenho único.
5. Dividem-se em redes exclusivas (em que os parceiros trabalham apenas com a empresa central) e redes abertas.
6. Têm mecanismos de construção de confiança e de relacionamento.
7. Não excedem a capacidade produtiva de cada membro –fator importantíssimo.
8. Contam com “donos de rede”, que, por sua vez, têm funções muito bem estabelecidas.
9. São focadas em uma região específica.